Conferência do PCP aponta caminhos para mitigar efeitos da seca no Alentejo

O PCP promoveu nas instalações da Universidade de Évora uma conferência sobre o problema da seca no Alentejo, na qual participaram dirigentes e eleitos do Partido e da CDU, académicos e técnicos.

A iniciativa promovida pela Direcção Regional do Alentejo sob o lema «A seca na região Alentejo: consequências e caminhos» permitiu um aprofundado debate sobre esta questão, nas suas múltiplas dimensões. As várias contribuições apresentaram pontos de vista e de análise próprios sobre a dimensão do problema e as suas causas, os seus efeitos ambientais e económicos e, claro, as soluções políticas indispensáveis para o minimizar e superar.

As variações climáticas, nomeadamente no que respeita aos níveis de precipitação, e a evolução das bacias hidrográficas e caudais dos rios foram analisadas na conferência, na qual se recusou, porém, limitar este grave problema a qualquer «fatalidade decorrente dos caprichos da natureza». Sobretudo porque – e o Alentejo é disso exemplo revelador – o maior ou menor impacto da seca na vida das populações está profundamente ligado a opções políticas: onde foram concretizados investimentos importantes, como é o caso de Alqueva, as consequências foram menores; onde as necessárias infra-estruturas não foram construídas (como são os casos de importantes zonas do Alentejo Central e Norte Alentejano) elas são mais graves.

Como ficou evidente em diversas contribuições, para inverter esta situação nem era preciso inventar nada: bastaria concretizar investimentos previstos ao longo dos anos em instrumentos de planeamento, como o Programa Nacional de Políticas de Ordenamento do Território, o Plano Regional de Ordenamento do Território do Alentejo, o Plano Nacional da Água, os Planos de Bacia Hidrográfica, entre outros. A incapacidade de armazenamento de água é a mais grave consequência desta reiterada opção política de sucessivos governos.

Medidas urgentes e de fundo

Mas há outros problemas que contribuem para a dimensão dos efeitos da seca no Alentejo. A opção por uma agricultura caracterizada pela intensificação do uso da água e da terra, numa lógica de acumulação de capital, é um deles. Em vastas áreas da região, concluiu-se na conferência, a vinha e o olival são a principal face desta realidade, que poderá ter efeitos nefastos a médio e longo prazo, não só a nível ambiental e paisagístico, como também económico e social.

Também a poluição e a contaminação de linhas de água e lençóis freáticos mereceram atenção no decurso do debate, pelas consequências que assumem na diminuição dos recursos disponíveis em condições de utilização adequada. São estas realidades, aliadas à fragilização e destruição de serviços públicos e à falta de medidas estruturais visando o desenvolvimento sustentado da região e a criação de emprego com direitos, que acentuam o despovoamento do Alentejo, com consequências na desertificação do território.

Na conferência, o PCP reafirmou a defesa (inclusivamente através da apresentação de propostas legislativas) de medidas excepcionais para a situação de seca, também ela excepcional, que actualmente se vive. O objectivo é assegurar o abastecimento de água e o desenvolvimento da actividade agropecuária. Estas medidas de mitigação e contingência, sendo fundamentais, não são suficientes, garante o Partido, que propõe outras, de fundo, capazes de planificar os investimentos necessários e definir prazos e meios para a sua concretização.

Um assunto que vai muito para além da água

Na conferência de dia 2 foram apresentadas várias medidas, de emergência ou de fundo, para minimizar os efeitos da seca no Alentejo. Algumas delas são propostas antigas, há muito defendidas pelo PCP e sucessivamente chumbadas pelos partidos da política de direita; se tivessem sido implementadas, a situação actual seria certamente outra, bem menos grave.

No imediato, o PCP defende a elaboração de um plano que hierarquize o uso da água em função da seca, combinando usos subterrâneos e superficiais numa lógica de complementaridade, privilegiando o uso humano, a saúde pública e a pequena e média agricultura. Para o PCP, qualquer intervenção nesta área terá que ter por base a titularidade e gestão públicas da água e a acção decisiva das estruturas da administração central, em coordenação com entidades regionais e locais.

As soluções políticas que visem reduzir as consequências de situações extremas de seca e melhorar a gestão dos recursos hídricos devem ter por base, para o PCP, uma perspectiva integrada que não se limite a medidas sectoriais. Assim, entre as propostas do Partido, reafirmadas na conferência, conta-se a aplicação do conceito de «rede hidráulica de infra-estruturas», como fonte de origem de armazenamento capaz de responder às necessidades, através da qualificação e reabilitação das existentes e construção de novas, e a valorização da lógica dos empreendimentos de fins múltiplos, como é por exemplo Alqueva.

A forma de gestão destes empreendimentos não é uma questão menor, sublinha o PCP, que defende a sua utilização como factor de promoção do desenvolvimento. Para tal, é fundamental adoptar um modelo que não assente na exaustão dos recursos e na exploração de mão-de-obra barata. Da mesma forma, a utilização da água para a produção de energia eléctrica não pode contribuir para impedir o acesso à água para outras utilizações.

A melhoria da capacidade de armazenamento de água, a ligação entre barragens, a correspondente construção de órgãos de regas, assumindo a ligação entre bacias hidrográficas, são questões decisivas, a par da aplicação de uma política tarifária de água que discrimine positivamente a pequena agricultura. Para os comunistas, também a divisão da terra deve ser assumida como instrumento de fixação da população e garantia de ocupação do território, de modo a dar corpo à ideia de uma reserva estratégica de terras que esteja associada a uma reserva estratégica de água.

(publicado no Jornal AVANTE)